A expansão em mercados diversos quanto o Brasil e os vizinhos latino-americanos carrega um dilema central para líderes à frente de multinacionais: como preservar a consistência de uma marca global sem perder relevância diante das particularidades culturais locais?
Desenvolver empresas centenárias fora de seus países de origem exige tato estratégico. Afinal, liderar uma série de reinterpretações guiadas pelos costumes e pelas reais necessidades de consumidores inseridos em um novo mercado é uma tarefa delicada, que deve ser executada de modo cuidadoso para preservar a imagem da marca.
Este dilema foi explorado em diferentes perspectivas na roundtable “Do Global ao Local: Multinacionais e a Conexão com Brasil e LATAM”. O painel, mediado por Joana Fleury, Diretora-Geral da L’Oréal Produtos Profissionais, reuniu Richard Le Moult, CMO da Pernod Ricard; Erica Mesquita, diretora de Field Marketing da Fortinet para América Latina; e Carla Mita, vice-presidente de Marketing da Visa do Brasil.
Enfrentando desafios semelhantes, os executivos encontraram soluções semelhantes. Equilibrar a consistência global e a relevância local, por exemplo, é uma medida adotada com sucesso pelas três marcas. Os meios para garantir este equilíbrio, por outro lado, variam. Na Visa, o caminho passa pelo bom uso de insights regionais.
“O fato de conhecer bem o consumidor, entender peculiaridades de cada região e até mesmo dentro do Brasil, que é extremamente diverso, nos ajuda a adaptar conceitos globais. Muitas vezes, iniciativas criadas aqui acabam sendo exportadas para outros mercados”, afirma Carla.

Na Fortinet, que atua no setor de cibersegurança, o processo de adaptação considera camadas que diferem entre os países latino-americanos. Isso porque o nível de maturidade tecnológica varia entre o Brasil e os vizinhos continentais. Esta característica exige níveis mais altos de precisão nas decisões estratégicas.
“Nem tudo que aplicamos no Brasil funciona na Argentina ou na Colômbia. A adaptação é muito personalizada e exige a consideração de fatores sociais, políticos e econômicos em cada mercado”, explica Erica Mesquita.
Já a Pernod Ricard parte da clara premissa de preservar o DNA da marca, sem deixar de abrir espaço para as conexões locais no processo. “O ponto de partida é respeitar estética, posicionamento e propósito globais. A partir daí, damos liberdade para criar vínculos com a cultura local, seja por meio de influenciadores, mídia ou experiências”, narra Le Moult.

Casos de tropicalização bem-sucedida
Casos de “tropicalização” do Marketing de marcas globais mostram de forma prática como transformar a estratégia global em narrativa local. O Vai de Visa, plataforma de relacionamento criada no Brasil e estendida a outros países da América Latina (nos quais teve o nome adaptado para Visa Club para fazer sentido em espanhol), é um exemplo disso.
A iniciativa reúne benefícios, descontos e programas de causas sociais, com milhões de usuários cadastrados. “É uma forma de levar valor agregado e personalização ao consumidor final e conhecer um pouco mais dele. Conseguimos não somente levar informações de tudo que os cartões Visa tem, mas também levar informações e conteúdos que façam sentido para o consumidor onde quer que ele esteja”, explica Carla.
Na Fortinet, a aproximação com o público brasileiro passou pela criação de um podcast em português sobre cibersegurança, conduzido por colaboradores da própria empresa. “Precisávamos falar a língua do Brasil, e essa iniciativa se transformou em sucesso. Hoje, até os clientes pedem para participar”, relata Erica Mesquita.

A Pernod Ricard, por sua vez, vem explorando intensamente parcerias culturais. Ações com Bruna Marquezine e a influenciadora Blogueirinha em torno da marca Absolut, além de iniciativas ligadas ao carnaval, ilustram essa aproximação. “Fomos a primeira marca de bebidas alcoólicas a entrar oficialmente em um desfile, celebrando as rainhas do samba. É um exemplo de como não basta estar presente, mas elevar a conversa cultural”, disse.
Lições para quem atua em multinacionais
Seria impensável entregar ao consumidor local exatamente o que ele deseja sem perguntar a ele o que ele deseja. Por isso, lideranças estrangeiras devem estar prontas para falar e escutar, convidando talentos regionais para mediar a conversa. “É essencial ouvir, recrutar os melhores talentos locais e dar autonomia. Meu papel é tirar barreiras para que as equipes expressem ao máximo sua criatividade”, disse o CMO da Pernod Ricard.
Conexão, conhecimento local e colaboração, somados à paixão pelo que se faz, são fatores determinantes para que a ideia de uma marca seja abraçada por uma nova comunidade. “É preciso estar aberto às diferenças culturais e ter coragem para enfrentar os tropeços, inclusive linguísticos. Faz parte do aprendizado”, finaliza Carla.
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