Antecipar movimentos tecnológicos antes que o mercado esteja preparado para absorvê-los é um traço central da trajetória de Valéria Duarte. Atual CMO da Cortex e mais recente entrevistada do podcast CMO Agenda, a executiva construiu sua carreira a partir de decisões tomadas em contextos de incerteza, quando internet, dados e IA não eram consensos no ambiente corporativo brasileiro.
Isso nos leva ao início do milênio, quando Valéria atuava na área de planejamento do McDonald’s. Naquele momento, a expansão da rede exigia uma compreensão detalhada do território, do perfil de consumo e da capacidade de cada região absorver novas unidades — algo inviável com mapas em papel e dados estáticos.
“Em 2000, os mapas eram em papel. Um software de mapa digital custava US$ 20 mil, e o mapa da cidade de São Paulo custava US$ 5 mil. Era totalmente inviável. Não dava para fazer gestão sem transformar o acesso a essas informações de forma contínua”, relembra Valéria.

A era Geofusion
A constatação narrada pela executiva deu origem à Geofusion, uma empresa criada para levar mapas e informações geográficas para a internet em um momento em que essa lógica ainda era praticamente inexistente no Brasil.
A proposta, no entanto, encontrou resistência imediata. Além da dificuldade técnica, havia receio das empresas em disponibilizar dados em ambientes virtuais. A adoção da solução exigiu um esforço intenso de convencimento e, principalmente, educação do mercado, desde ensinar executivos a navegar em mapas digitais até demonstrar a segurança do uso da internet para decisões estratégicas.
Esse cenário ganhou novos contornos em 2006, com a chegada do Google Maps ao Brasil. A entrada de um player global parecia, à primeira vista, uma ameaça direta à sobrevivência da Geofusion. A leitura, porém, mudou à medida que o comportamento do mercado começou a se transformar.
“O que parecia uma ameaça virou uma enorme oportunidade. As pessoas passaram a se localizar nos mapas, a procurar negócios, e isso mudou completamente a mentalidade do consumidor. Era hora de surfar essa onda”, narra a CMO.

A capacidade de sustentar uma visão mesmo diante de rupturas tecnológicas se repetiria em outros momentos da trajetória da empresa, como na transição para o modelo SaaS. Durante anos, muitas organizações resistiram à ideia de consumir software como serviço, exigindo soluções instaladas localmente. Ainda assim, a estratégia foi mantida, ancorada na expectativa de que o mercado amadureceria eventualmente.
Essa expectativa, aliás, foi baseada em uma perspectiva alimentada por Valéria, que se provou correta em mais de uma ocasião: inovar frequentemente significa conviver com um descompasso entre visão e timing. “Muitas vezes você tem uma ideia fantástica, mas muito antes do tempo em que o mercado está pronto para recebê-la. Por isso, resiliência e flexibilidade são fundamentais”, diz.
A era Cortex
O percurso da profissional culmina no M&A concluído em 2022, quando a Geofusion passou a integrar a Cortex. A partir desse movimento, a solução de inteligência geográfica se tornou parte de um portfólio mais amplo, estruturado em torno de uma metodologia proprietária de inteligência de go-to-market.
Hoje, a Cortex atua em diferentes frentes — do varejo à indústria de bens de consumo e ao mercado B2B — com foco na eficiência contínua de Marketing e vendas. Na prática, essa abordagem envolve mapear o tamanho real do mercado endereçável, entender o momento correto de oferta, definir canais, mix de produtos e territórios comerciais com base em dados atualizados.
No B2B, o método vai além das informações firmográficas tradicionais e incorpora variáveis que indicam o momento de compra das empresas, apoiando desde a estratégia comercial até a automação de pré-vendas. A inteligência artificial sustenta esse modelo, mas aparece no discurso da empresa de forma pragmática, distante do hype recente em torno do tema. Neste contexto, a tecnologia só faz sentido quando gera impacto mensurável no negócio.
“Hoje, todo mundo diz que tem IA, mas a pergunta é: o que isso muda de forma prática, no nosso resultado? A inteligência artificial virou algo comum como a eletricidade. Mas ninguém investe em uma empresa porque ela tem eletricidade, mas porque ela entrega valor” pondera Valeria.

Na Cortex, a IA é aplicada em modelos preditivos capazes de estimar, por exemplo, o faturamento potencial de uma loja antes mesmo de sua abertura, a partir de grandes volumes de dados de mercado, comportamento e território. A mesma lógica se aplica ao monitoramento de marca, que processa diariamente grandes quantidades de informações para identificar narrativas, riscos e oportunidades em tempo quase real.
Essa filosofia também explica o investimento contínuo da Cortex em educação de mercado. A empresa mantém uma estrutura dedicada à capacitação de clientes e profissionais, entendendo que a adoção de metodologias complexas depende de formação e entendimento profundo – algo recorrente na notável carreira da CMO
“Quando criamos categorias novas, precisamos educar o mercado sobre elas. Não dá para só entregar o software. Ensinar faz parte do nosso DNA e da nossa história, e isso é realmente muito legal. E quando você vê alguém falando ‘agora eu entendi, agora eu vou resolver o meu problema muito mais rápido’, isso faz toda a diferença”, finaliza Valéria.
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