O conceito de alta performance sempre esteve associado à produtividade, mas o debate contemporâneo tem reposicionado esse ideal. No lugar da busca incessante por fazer mais em menos tempo, ganha espaço uma visão que valoriza mais consistência, equilíbrio emocional, bem-estar e clareza de propósito.
O direcionamento encontra respaldo em um número preocupante: 75% das mulheres em posições de liderança experimentam o fenômeno do impostor em algum momento de suas carreiras, conforme apontam dados de uma pesquisa divulgada pela Forbes em 2023.
O fenômeno pode surgir logo no início da carreira: 55% das jovens profissionais mulheres entrevistadas em um estudo do American Perspectives Survey relataram ter sentido que não eram boas o suficiente em seus trabalhos.
Esse foi o ponto de partida da roundtable “Liderança de alta performance: superando a ansiedade e a síndrome do impostor”, que reuniu executivas brasileiras para discutir os bastidores de liderar em um cenário de pressões crescentes.
Parte da programação do CMO Summit 2025, o debate trouxe à mesa a experiência de três profissionais com trajetórias em contextos distintos: Ana Gabriela Marin, CMO da Performa IT, Glaucia Hora, Global Digital Marketing Manager na 73 Strings, e Paola Bandinelli, Growth Marketing Manager da Revelo.
Partindo de planos de fundo profissionais diferentes mas experiências de vida que, de muitas formas, se encontram e se conectam, as especialistas convergiram para um mesmo diagnóstico: a alta performance não se sustenta sem limites claros, organização e cuidado com a saúde mental.

O efeito do fenômeno do impostor
O debate seguiu para um tópico especialmente sensível na carreira das mulheres: a síndrome do impostor. Carina Lima, a mediadora do painel, trouxe uma ressalva importante: o termo original, cunhado pela psicóloga Pauline Clance, foi revisto pela própria autora para o fenômeno do impostor, pois não se trata de uma doença.
A experiência da Glaucia Hora ilustra bem a manifestação do fenômeno: ela compartilhou um episódio de quando foi convidada a liderar a expansão de uma empresa croata para o mercado americano. Apesar de ter uma carreira global consolidada e se comunicar 100% do tempo em inglês , ela se perguntou se o seu inglês era bom o suficiente para a nova posição.
“Quando me convidaram para liderar a expansão, a síndrome do impostor me atingiu com força. Senti o peso da minha história como mulher, negra e periférica. O questionamento sobre o meu inglês veio à tona, mesmo eu me comunicando 100% do tempo na língua. A mensagem que eu gostaria de passar é: você nunca se sentirá 100% pronta. Então, não espere por isso para assumir um novo cargo ou tarefa. Apenas vá em frente e enfrente o desafio”, disse.

O mesmo fenômeno foi experimentado pela Ana Gabriela Marin ao ser promovida a CMO da Performa IT. Ela explicou que, nessas horas, é crucial se lembrar das próprias conquistas. Para isso, ela mantém uma linha do tempo de sua carreira e a revisita para se lembrar de sua trajetória e de que ela merece a posição que conquistou. Ana pontuou que os atalhos não existem e que a jornada de cada um é um lembrete de que sua presença é merecida.
“A impostora me visita de vez em quando? Sim, acontece. Mas quando isso acontece, eu começo a me questionar: será que isso é o fenômeno do impostor ou é um excesso de insegurança por ser mulher e ter minha competência constantemente questionada? O que eu faço nessas horas? Eu construí uma linha do tempo com a minha jornada e minhas conquistas e a revisito. Então, penso ok, estou pronta. Que venha o desafio”, narrou.

Paola Bandinelli compartilhou uma história semelhante. Mesmo suas habilidades mais fortes, como o domínio do inglês, já se vestiram de pontos de interrogação que criaram questionamentos sobre sua competência ao assumir um novo cargo. A executiva ressaltou que esse questionamento pode travar o avanço profissional, mas que existem mecanismos para seguir em frente.
As profissionais trouxeram dicas práticas para lidar com o fenômeno. Uma estratégia é nomear o medo, pois isso ajuda a resolvê-lo. Outra tática é ter uma rede de apoio e mentores, já que a mentoria executiva pode tornar o caminho mais leve. O trio citou a comunidade "Mulheres de Growth" como um exemplo de ambiente em que a troca de experiências e a sororidade impulsionam a autoconfiança para enfrentar novos desafios.
Percepção x Realidade
Por muito tempo, falar em alta performance no trabalho significava enaltecer a capacidade de produzir mais em menos tempo. Essa percepção não acompanha as complexidades que envolvem exercícios de liderança, e passa a ser substituída por outra noção: a de que alta performance não é sobre velocidade, mas sobre consistência com equilíbrio emocional e propósito.
Neste contexto, a agenda de um líder precisa ser tratada como um planejamento estratégico. A lógica, explicou Ana Marin, não se restringe a metas corporativas, mas também à vida pessoal. “Quando estou nutrida e com a cabeça boa, sou altamente produtiva. O descanso não é um prêmio, é uma estratégia”, afirmou a CMO.
Glaucia levou a reflexão além: em ambientes multiculturais e atravessados por fusos horários distintos, aprendeu que saber dizer não é tão estratégico quanto entregar mais. A constatação nasceu de uma experiência dura, quando a sobrecarga de mensagens fora de hora culminou em uma crise de saúde. Desde então, a profissional colocou limites como parte inegociável de sua liderança.
Liderar em alta performance não significa evitar erros nem estar permanentemente pronto, mas normalizar a vulnerabilidade, colocar limites e assumir que o equilíbrio é dinâmico. A pressão invisível sobre mulheres líderes continua a ser um desafio, mas, ao trazer esse debate ao palco, as profissionais sinalizaram que os caminhos para superar ansiedade e insegurança passam menos por respostas individuais e mais por um pacto coletivo de cuidado, apoio e redefinição de métricas de sucesso.
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