Ainda que a técnica de assessoria de imprensa já esteja presente há um bom tempo no setor empresarial brasileiro, há inúmeros erros e desconhecimentos que insistem em perseguir os executivos de marketing. Os profissionais também têm cometido equívocos recorrentes por suposições, analogias e inabilidade neste território, aparentemente descomplicado, mas que esconde por trás nuances complicadas e sutis.
Se você é um executivo de marketing que acha que entende bastante de assessoria de imprensa, então esse texto é para você mesmo. Mas se você, não entende nada deste assunto o conteúdo também é para você.
O grande problema do profissional do marketing é que essa especialidade tem sido tratada bem superficialmente nos livros dessa área, nos MBAs, pós-graduações e outras fontes de conhecimentos. Mas será que os magos Philip Kotler, Al Ries, Theodore Levitt, Jack Trout, Peter Drucker ou mais recentemente Seth Godin já escreveram, por acaso, algum artigo sobre o assunto? Pelo visto não, ainda que tenham resvalado nas Relações Públicas, onde segundo a literatura da gestão de negócios, a assessoria de imprensa é teoricamente parte. Na verdade, no universo mercadológico a assessoria de imprensa não chegou na profundidade do conhecimento que ela faz jus e merece.
Fizemos aqui uma lista temática a seguir para ajudar você e todos os gestores de marketing a tomar decisões corretas, sem recorrer ao desgastado feeling e a perigosa ciência da achologia teórica. Vamos lá então:
1. Assessoria de imprensa não é publicidade, nem Marketing digital
A pior coisa que você pode fazer no seu trabalho como marketeer é tratar a assessoria de imprensa como uma forma de publicidade ou marketing digital. Nunca faça isso, qualquer que seja a razão. A publicidade e o marketing digital trabalham com mensagens comerciais, de estímulo a vendas, ou também de cunho corporativo. Entretanto, mesmo no caso de uma propaganda institucional ela não tem a rigor o mesmo papel que uma notícia, nota, artigo, texto-legenda, entrevista Q/A, sinopse ou reportagem, entre outras tipologias jornalísticas que podem ser usadas num trabalho de assessoria. São formas e formatos diferentes muito característicos. Lembre-se: maçã não é abacaxi, nem banana.

Um anúncio usa sua narrativa com técnicas do copywriting, recorrendo à criatividade e apelos que procuram coagir o público-alvo ou persona para uma ação de interesse como uma compra ou para preencher uma landing page, por exemplo. Já um press-release ou comunicado de imprensa em geral se apropria da técnica narrativa de uma notícia jornalística e procura essencialmente narrar um fato ou situação que seja favorável à marca da empresa ou produto. As notícias negativas a própria imprensa dará quando houver.
Há um conceito no meio da comunicação que é a separação ‘Igreja e Estado’, ou seja, uma remissão histórica sobre a separação do governo e a Igreja, situação que ainda havia no período do império. Portanto, publicidade/marketing digital não devem jamais se misturar diretamente com divulgação jornalística, no máximo se complementarem. E na hora de avaliar o trabalho procure usar as métricas das plataformas de mailing list, não as do marketing digital.
2. Adjetivar e não substantivar press releases
O press-release ainda é principal ferramenta na operação da assessoria de imprensa, e geralmente é uma notícia positiva da empresa ou organização. Mas se o leitor perceber que não se trata de uma informação genuína e entender que é anúncio ‘disfarçado’, o recurso perderá sua força, credibilidade e influência. O receptor, hoje em dia, está muito mais atento a identificar os interesses por trás das mensagens no processo da comunicação, especialmente com a chegada da Inteligência Artificial.

Um press release, portanto, deve transmitir informações relevantes que ajudem a audiência no conhecimento e no processo de decisão. Se um texto contém muitos adjetivos, ele naturalmente vai perder sua autoridade, confiança e importância. Um press-release deve se integrar ao conteúdo editorial da publicação naturalmente, sem destoar, por isso, precisa ficar conectado ao resto do noticiário de certa forma como parte orgânica da linha editorial do veículo.
Portanto, cuidado com o que você deseja que escrevam, o que os receptores desejam saber e o que deve ser escrito efetivamente. Quando estiver tratando de assessoria de imprensa tenha memória seletiva e esqueça definitivamente do marketing digital e a publicidade. Além disso, é sempre bom lembrar que jornalismo não é literatura. O texto tem que ser sobretudo claro, objetivo e tanto quanto possível conciso.
3. Não ‘escorregue’ nas inverdades
Uma situação terrível para um veículo de imprensa é ser enganado por alguém. Quando uma fonte ou porta-voz transmite uma mentira, deliberadamente ou não, para um repórter, causará um grave problema de imagem para sua empresa ou organização. A razão é que o veículo tem responsabilidade compartilhada e também será inevitavelmente associado à falsa informação. O problema é quando a informação se torna calúnia, difamação ou injúria, que são crimes contra a honra. Os tempos hoje estão bicudos, os processos e assédios judiciais são crescentes, e por isso os cuidados com o dito são imprescindíveis.
É preciso frisar ainda que repórteres e editores são profissionais especializados em verdade e mentira, e com o tempo eles percebem no ar o cheiro dessas palavras.
Os assessores de imprensa, por seu turno, não podem garantir a um veículo que uma matéria é exclusiva e inédita se ela definitivamente não for. Se um assessor fizer essa prática, com anuência do setor de marketing, seguramente, vai perder a confiança e respeito da publicação que pode fechar as portas definitivamente daquele veículo.
Em matérias polêmicas ou de risco é preciso medir sempre pela régua da repercussão e seus desdobramentos na Opinião Pública, mesmo o conteúdo sendo verdadeiro. Às vezes o melhor a fazer é não divulgar informações que possam gerar problemas futuros ou polêmicas. Por dever de ofício, a imprensa aprecia a polemização porque estimula o debate público, gera novas informações e pontos de vista diferentes, melhorando a contextualização do fato. Atrai ainda audiência, estimula o pensamento crítico e dá visibilidade a temas importantes.
Contudo do ponto de vista da fonte nem sempre expor certas informações reservadas é conveniente. O arrependimento é uma das situações mais desagradáveis que ocorre quando algumas palavras inadequadas são proferidas, principalmente em se tratando da imprensa e do seu poder de ressoar informações.
A maioria dos semileigos em assessoria de imprensa não sabe, mas nos critérios de noticiabilidade, a negatividade é bastante considerável, porque impacta mais do que as boas notícias. Além disso, as más são mais fáceis de noticiar do que as boas. Cientificamente, ficou constatado que na hierarquia de preferência do leitor, entre as más e boas notícias, as primeiras são mais utilizadas. É triste, mas é assim, é a verdade.
4. Procure sempre o ‘Gancho Jornalístico’
Muitos profissionais de marketing pensam que boa parte das notícias que é publicada na mídia jornalística ocorre apenas por causa das relações de amizade e somente isto bastaria. Isso é um erro grave. As relações de amizade podem aproximar assessores de repórteres e editores até certo ponto, mas não é o suficiente para garantir publicações. O que vale na hora H é se a informação que está sendo tratada tem ou não ‘gancho jornalístico’.

O Manual de Redação da Folha de S.Paulo define esse termo como aquilo que uma pauta de uma notícia ou reportagem precisa conter, ou seja, alguma razão para que lhes dê atualidade e interesse geral para justificar sua publicação. Os jornalistas nos veículos de imprensa sempre devem procurar o gancho em suas matérias e evidenciá-lo para o leitor.
Trocando em miúdos, o ‘gancho’ é a razão ou elemento que torna uma notícia ou reportagem relevante e interessante no momento. Esta palavra- chave responde à pergunta: “Por que essa matéria deve ser publicada agora?”. Se numa notícia ele é importante, no press release também. Não adianta querer transformar aquilo que não tem ‘DNA’ noticioso (gancho) em notícia ou reportagem por interesse mercadológico momentâneo. O gancho é fundamental para prender a atenção do público e justificar a relevância da matéria. É o tópico relevante e oportuno que serve de base para uma narrativa jornalística. É uma maneira de conectar uma matéria a eventos, tendências ou questões atuais. Ele é o que ajuda a tornar a matéria mais atraente e digna de ser noticiada para o público. O significado de gancho é exatamente ajudar a fisgar o leitor com uma história relevante a ser difundida.
Especialistas em teoria do jornalismo conceituam um gancho jornalístico como aquele ponto de partida, uma ideia central ou uma abordagem específica que atrai o interesse dos leitores e define o tom de uma matéria ou reportagem. É o elemento que faz com que a notícia se destaque e capte a atenção do público. Se, por exemplo, um alto executivo viaja de 1ª classe num avião para a Europa não é notícia, mas se a aeronave dele com 200 passageiros a bordo fizer um pouso forçado numa pequena ilha no meio do Atlântico ele será certamente notícia. Às vezes é uma questão de detalhe...
5. Mantenha um bom relacionamento institucional com jornalistas, mas não mais do que isso
No relacionamento profissional entre assessores de imprensa e jornalistas de veículos vale destacar que tem importância, mas não é sempre determinante para emplacar sugestões de pauta, releases ou artigos de opinião. Eventualmente, algum texto enviado até poderia ser publicado por cortesia ou gentileza, mas com certeza não será uma prática frequente se não houver ‘gancho’ nos textos. Se um editor fizer isso com frequência possivelmente terá problemas com a chefia, porque seu leitorado/audiência compra, assina ou quer é apenas informação que lhe interessa e irá ajudá-lo de alguma maneira, e não contribuir com o amigo do editor.
Aquilo que a mídia sempre busca é informação relevante, se possível antes de todos e com exclusividade, o chamado ‘furo jornalístico’. O furo é o que a mídia sempre procura, ou seja, uma notícia importante, exclusiva, inédita, e que sobretudo vai contribuir com a Opinião Pública. Um repórter ou editor não é amigo ou inimigo, eles têm interesses profissionais, assim como uma fonte/porta-voz.

Recentemente num webinar uma conceituada editora de um grande jornal de São Paulo admitiu que é importante o relacionamento duradouro entre assessores e repórteres/editores e revelou que com alguns dos profissionais de assessoria, ela tem contato há mais de uma década e por isso existe uma relação respeitosa. Às vezes por dever de ofício esse assessor tenta lhe ‘vender’ uma pauta, mas sabendo de antemão que não vai emplacar aquilo, mas prossegue. Neste caso ela disse que “responde com o maior carinho”, mas adianta sem hesitação que “não vai rolar”. Ela explicou: “A partir do relacionamento vem a confiança, e depois desse início se constrói um relacionamento com o assessor”.
O importante disso, é que você profissional de marketing precisa definitivamente compreender que ‘só amizade não ganha jogo’ na imprensa. Se no mercado um vendedor de produtos ou serviços não vende só pela amizade, porque então um assessor ‘venderia’?
Uma outra recomendação importante, inclusive em qualquer lugar, é seu assessor nunca ser inconveniente, deseducado e inoportuno. Não é saudável que o seu assessor envie insistentemente e.mails cobrando respostas e posicionamentos dos jornalistas da redação. Portanto, você como cliente não deve ficar fazendo isso também. Esse comportamento invasivo pode comprometer novos envios de sugestões de pautas, notas, artigos e releases, e nas próprias interações entre os profissionais. O trabalho jornalístico já é naturalmente exaustivo e árduo, assim é melhor não o deixá-lo ainda pior.
Outro ponto importante: por mais influência que tenha uma assessoria de imprensa jamais ela pode garantir que um press release será publicado, antes de ter a confirmação após a avaliação dos editores do veículo. A assessoria de imprensa juridicamente é classificada como uma atividade de obrigação de meio e não uma obrigação de resultado.
Isso significa que o papel do assessor de imprensa é realizar todos os esforços necessários, de maneira cuidadosa e adequada, para tentar alcançar as metas acordadas com o cliente, como divulgar informações positivas na imprensa. Contudo, seu assessor não pode assegurar qualquer resultado específico, como a publicação de notícias em determinados meios de comunicação ou o resultado exato de qualquer repercussão. Da mesma forma os advogados também não podem garantir com certeza certas causas como ganhas antes da sentença definitiva do juiz em casos “transitado em julgado”.
6. Cuidado com o gerenciamento de tempo
Entre os maiores problemas no relacionamento entre as fontes/porta-vozes e os jornalistas das redações é a gestão do tempo. O dia a dia do jornalista é muito apressado e quase sempre tudo é imediato. Eles são escravos dos seus fechamentos. Se houver a situação de o jornalista NÃO entregar sua matéria antes do fechamento será uma tragédia.
Como você sabe, os profissionais de marketing na maior parte das vezes têm mais tempo para analisar e decidir sobre os planos e mesmo em ações pontuais no seu trabalho. Esse tempo de análise e maturação, por sinal, é muito importante para o profissional não tomar decisões intempestivas e atabalhoadas, por isso é difícil para os executivos entenderem essa lógica singular no jornalismo.
No filme Noivo em Fuga, um personagem resumiu muito bem o assunto, definindo que “o jornalismo é a literatura que tem pressa”. Os jornalistas, queiram ou não, são subservientes aos ‘prazos opressores’. Por sinal, jornalismo e imprensa nasceram regidos pelo tempo. Quanto mais as fontes/porta-vozes entenderem essa cultura profissional melhor será sua relação com os jornalistas.
Se por acaso um jornalista ligar para sua fonte no meio da madrugada ou no final de semana por alguma urgência profissional e for atendido cordialmente, aquele profissional de imprensa nunca mais irá esquecer essa gentileza e a gratidão sempre será recompensada de algum modo.
7. Nunca peça para ler a matéria antes da publicação
Entre as excelentes dicas publicadas pelo Reuters Institute está uma em que recomenda que todas as publicações jornalísticas, em suas políticas editoriais, precisam inserir a diretriz (caso não a tenha) de o repórter não submeter seu copião (rascunho) para verificação de sua fonte antes da publicação.

À primeira vista pode parecer que o veículo não estaria interessado na ocorrência de erros de informação nas suas matérias. Não é bem isso. O maior problema dessa análise prévia é que poderia se configurar numa forma de autocensura o que seria uma agressão à liberdade de imprensa ou liberdade de expressão. Além disso há o risco de a fonte alterar o tom ou a linha editorial da matéria; evitar alguma crítica ou modificar informações por conveniência, que não sejam de fato erradas, mas importantes; ou ainda comprometer a independência jornalística.
No Capítulo I - Do direito à informação, do Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros, item V, dispõe que “a obstrução direta ou indireta à livre divulgação da informação, a aplicação de censura e a indução à autocensura são delitos contra a sociedade, devendo ser denunciadas à comissão de ética competente, garantido o sigilo do denunciante”.
Em muitas situações os editores das publicações, mesmo sob o risco da incorreção, publicam o texto finalizado pelo repórter e depois, se for confirmado o erro, publicam uma errata, reconhecendo e sinalizando o problema, e se retratando publicamente. Não é o ideal, mas é o praticável.
A análise prévia da fonte pode ser flexibilizada apenas em situações excepcionais em entrevistas sensíveis ou extremamente técnicas, e deve ser negociada antes dessa entrevista ser concedida, pois ela pode nem concretizada, dependendo do caso. Da mesma forma, precisam ser tratadas as informações em background (aquelas em que o jornalista cita a informação sem creditar à fonte) e também informações em off-the-record quando as informações não podem jamais ser publicadas, nem atribuídas de nenhuma forma. São aquelas conversas com o repórter apenas para seu entendimento do contexto, e informações exclusivas somente para conhecimento daquele jornalista.
Uma figura importante do jornalismo e da política brasileira no século passado, Carlos Lacerda, proprietário do jornal Tribuna da Imprensa disse uma vez: “Aquilo que não posso publicar no jornal, não quero nem tomar conhecimento”. Para ele, essa postura podia evitar pressões ou dilemas éticos. Era conhecido por seu jeito combativo e sua forte defesa da liberdade de imprensa.
Outro famoso e polêmico jornalista, o americano Pierre Salinger do telejornal ABC News, do jornal San Francisco Chronicle, e da revista francesa L'Express e também secretário de imprensa dos ex-presidentes dos Estados Unidos John F. Kennedy e Lyndon B. Johnson, declarou certa vez: "O dever de um jornalista é buscar a verdade, mas também compreender o poder das palavras e suas consequências." Ele defendia que o equilíbrio entre transparência e estratégia é fundamental.
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