Pegue uma caneta e um pedaço de papel. Tire uns minutinhos aí, reflita, e tente escrever como você definiria para alguém que não é da área o que é marketing.
Imagino que não tenha sido fácil. É possível, inclusive, que você não tenha conseguido chegar a uma definição satisfatória. Pra te deixar mais tranquilo, vou dizer que esse é um debate antigo. Vários autores já deram sua visão sobre o que é marketing, sobre o que não é marketing, sobre o que uma definição deveria ter etc.
A coisa não é fácil. Mas ter uma definição é importante, porque definições estabelecem significados, descrevem qualidades essenciais, e delineiam os limites ou a extensão de algo, diferenciando-o de outras coisas. Definições permitem que aqueles que concordam com ela possam expandir o conhecimento a partir dela, assim como permitem que aqueles que não concordam com ela expandam o conhecimento a partir dela (spoiler alert: Philip Kotler é um que fez isso, mas falaremos sobre isso em outra ocasião).
Pra não discutir diversos autores, resolvi focar apenas na definição da American Marketing Association, a AMA. Pra quem não conhece, a AMA é uma entidade fundada em 1937, resultado da fusão de duas outras associações, a National Association of Marketing Teachers e a American Marketing Society. Atualmente, a AMA tem mais de 36.000 afiliados, que incluem acadêmicos, gestores, pesquisadores, consultores e estudantes, e define sua missão como facilitadora e promotora da prática, ensino e estudo do marketing.
Pois bem, a AMA soltou, em 1948, sua primeira definição de marketing: “Marketing é a realização de atividades de negócios que direcionam o fluxo de bens e serviços dos produtores para os consumidores”. Esta definição, na verdade, é de 1934, e quem a propôs foi a National Association of Marketing Teachers, mas a AMA achou que ela ainda valia, então publicou-a novamente em 1948.
Reparem que é uma definição bastante restritiva, que limita o marketing basicamente à distribuição apenas (sim, no começo essa era a grande preocupação mesmo), e somente de bens e serviços ao consumidor. Nada de B2B, portanto.
Foi só em 1985, por incrível que pareça, que a AMA atualizou a definição de marketing. Agora, refletindo muito do que os principais autores e livros de marketing vinham retratando, marketing foi definido como “o processo de planejar e executar a concepção, precificação, promoção e distribuição de ideias, bens e serviços para criar trocas que satisfaçam objetivos individuais e organizacionais”. Leia novamente e perceba quanta coisa mudou no que se entendia por marketing nesses 37 anos entre as duas definições.
Pra início de conversa, surgiu o conceito de marketing mix (os famosos 4 Ps). Outro conceito importante que surgiu foi o de troca, mas não qualquer troca, e sim uma troca que visa gerar satisfação nos participantes da troca, que podem, vejam só, ser duas empresas (olha aí o B2B aparecendo na jogada). Essas mudanças refletem fortemente o surgimento da escola gerencial de pensamento do marketing, escola predominante até hoje e sobre a qual conversaremos bastante daqui pra frente.
Em 2004, uma nova atualização da definição de marketing. A AMA agora dizia que o “Marketing é uma função organizacional e um conjunto de processos para criar, comunicar e entregar valor aos clientes, e para gerenciar relacionamentos com os clientes de forma a beneficiar a organização e seus stakeholders”.
Caramba, que baita mudança, hein? Apesar de enxergar marketing apenas como uma função da empresa, e não como uma filosofia de negócios como defende-se atualmente, veja como a coisa começou a pegar uma forma mais parecida aquilo que falamos hoje em dia.
O conceito de valor, que está no centro desta nova definição surgiu e cresceu muito na década de 90, principalmente devido ao crescimento de uma escola de pensamento de Trocas Sociais, que via o valor percebido como sendo o principal motivador por trás de uma troca. Além disso, uma maior atenção por parte de pesquisadores e pensadores ao marketing de serviços favoreceu a adoção do conceito de valor, já que na compra de um serviço o cliente, de certa maneira, “não compra nada”, o que fez com que a discussão sobre o que motiva uma troca se aquecesse.
Depois de 2004, a AMA criou um processo diferente para a definição do que é marketing. O que antes ficava a cargo de poucos participantes, agora é um processo em que todos os afiliados podem participar e que prevê novas rodadas de atualização a cada 5 anos. A primeira definição nesse novo processo é de 2007, e vem sendo mantida desde então, pois os afiliados não tem visto necessidade de atualizá-la.
“Marketing é a atividade, o conjunto de instituições e os processos para criar, comunicar, entregar e trocar ofertas que tenham valor para clientes, consumidores, parceiros e para a sociedade em geral". Tá aí. Esta é definição atual que a AMA dá para o Marketing. Sabe o que eu acho legal nessa definição? É a primeira vez em que a “sociedade em geral” é levada em consideração. De novo, vejam como isso é emblemático dos tempos em que vivemos, tempos em que a preocupação com o meio ambiente e com o bem estar das pessoas é gritante.
Vale destacar que a AMA representa o pensamento americano. Pense no que você sabe sobre a história recente dos EUA: a crise de 29, o período pós guerra, a guerra fria e o surgimento dos EUA como potencia ocidental. Não é bacana ver como a evolução da definição de marketing segue as mudanças de contexto social, politico, econômico? Eu poderia terminar o texto como um historiador faria, dizendo que a história do marketing é um reflexo da sociedade, mas eu vou terminar como um profissional de marketing: pois é, até a definição de marketing sofre o efeito do macroambiente!
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