Minha vó já dizia: “esse mundo está perdido” e como ela, desde o tempo dos grandes filósofos que questionavam a existência do homem e seu propósito na vida, as catástrofes, conflitos, guerras e provações acompanham a nossa história. Entretanto, quando as estamos vivendo, tudo parece maior e assustador. À luz dos últimos acontecimentos do Rio Grande Sul, ou mesmo de tantos outros eventos climáticos extremos que acompanhamos atônitos pela TV ou assistindo documentários no streaming, estamos certamente nos perguntando: o que podemos fazer? Está perdido mesmo? ou, Ainda podemos fazer algo por nós e pelo nosso planeta?
Em 2021, em um estudo global com mais de 10 mil cidadãos, 78% apontaram que desejam viver vidas mais sustentáveis, 63% têm feito mudanças modestas a significativas para consumir produtos mais sustentáveis, e 34% estão dispostos a pagar mais por produtos mais sustentáveis. No Brasil, em outro estudo, os entrevistados acreditam que cuidar do planeta é uma responsabilidade das pessoas (54%), dos governos (50%) e das marcas (44%). As empresas/marcas devem se empenhar em obter certificações confiáveis, uma vez 84% dos participantes consideram importantes os selos que atestam o comprometimento das empresas com as causas sociais e/ou ambientais. Metade dos respondentes da pesquisa se mostrou disposto a pagar mais por um produto certificado.
Esses dados mostram a relevância e urgência do tema da sustentabilidade e do consumo consciente para o consumidor moderno. Mas isso não é de hoje. Kotler em seu livro Marketing 3.0, em 2010, já apontava para uma mudança do marketing centrado no consumidor para o marketing centrado no humano (human-centric marketing). Na publicação, os autores oferecem um guia para as empresas se manterem alinhadas aos valores e anseios dos consumidores modernos e ávidos por propósito em seu consumo associando-se a empresas que impactam positivamente a sociedade. Neste sentido, os autores recomendam as empresas a alinharem suas estratégias de marketing com os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), demonstrando como estão buscando se comprometer a resolver os complexos problemas sociais e climáticos da sociedade moderna.
Produto verde é um rótulo guarda-chuva, que pode ser utilizado para uma ampla variedade de mercadorias, com processos produtivos que visam minimizar o impacto ambiental. No caso de cosméticos, estes assumem diversas nomenclaturas, como cosméticos naturais, veganos, orgânicos, cruelty-free e clean beauty. Tais produtos tem foco na preservação do meio ambiente, minimização da poluição, uso responsável de recursos não renováveis e bem-estar animal, além da preservação das espécies. Este é um mercado em pleno e vigoroso crescimento aqui no Brasil quanto no mundo.
Entretanto, pouco se sabe sobre os motivos que levam o consumidor a pagar mais pelo cosmético verde em detrimento do cosmético tradicional. Tem-se como hipótese inicial que o consumidor de produtos verdes possui um comportamento de consumo consciente. Mas o que seria isso? O consumidor consciente busca de forma deliberada adquirir, usar e descartar produtos visando minimizar as consequências negativas e maximizar as positivas seja para o meio ambiente quanto para a sociedade.
Recentemente foi realizada uma pesquisa no âmbito do Mestrado Profissional em Comportamento do Consumidor da ESPM com objetivo de investigar o efeito da confiança ambiental e das motivações (intrínsecas e extrínsecas) no consumo de cosméticos verdes. Foi aplicado um questionário com 386 consumidores de cosméticos verdes para cuidados com a pele (skincare).
A pesquisa evidenciou a confiança no produto/marca como elemento fundamental na formação das motivações intrínseca e extrínseca dos consumidores. Essas motivações são essenciais para entender o comportamento de consumo, especialmente em contextos ambientais. A pesquisa destaca que, enquanto a motivação intrínseca está diretamente relacionada ao interesse pessoal do indivíduo, a motivação extrínseca se desenvolve a partir de fatores externos e introjetados. Os resultados também mostram um impacto significativo dessas motivações no consumo consciente. Em particular, a confiança ambiental dos consumidores promove uma forte preferência por produtos que possuem atributos ambientais benéficos, em detrimento daqueles associados a benefícios sociais.
Este estudo mostra a crescente relevância da confiança na marca e da motivação na decisão dos consumidores de optar por práticas mais sustentáveis, o que pode ter implicações significativas para empresas focadas em sustentabilidade e responsabilidade social, como alertado por Kotler no início da década de 2010.
O estudo evidencia que não se trata de discurso, mas sim de comportamento. Em outras palavras, e como demonstraram as duas pesquisas do início deste artigo, os consumidores querem ação e estão buscando fazer a sua parte. Resta saber se todos os agentes econômicos estão igualmente comprometidos.
Diferente da minha querida vozinha, eu acho que o mundo ainda não está perdido. Está sim mais caótico, complexo, o que nos torna mais vulneráveis. Mas essa não é a conhecida fórmula para ativarmos a resiliência que tão bem conhecemos? O crescimento expressivo no consumo de produtos naturais e verdes indica essa mudança de comportamento: a busca por ajudar nosso planeta e nos ajudar de forma individual e coletiva, estabelecendo um estilo de vida mais sustentável. Então, bora trabalhar soluções que ativem nossas motivações intrínsecas e extrínsecas para construir um mundo melhor!
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