O mês de Setembro é mundialmente conhecido como o período de proteção à saúde mental, em que impera a campanha mundial da “Fita Amarela”, cujo objetivo está em conscientizar a população sobre a importância dos cuidados não só com a saúde do corpo, mas também com a da mente.
O lema do Setembro Amarelo de 2023 é “Se precisar, peça ajuda” e, com base nele, diversas campanhas de marketing já estão em ação, para contribuir com a popularização da pauta nos mais diversos segmentos. No entanto, é preciso cuidado. Chamar a atenção para as estatísticas de destaque e abordar a violência autoinfligida como um cenário comum, pode acabar produzindo o efeito contrário ao esperado pela publicidade.
Exemplo disso é o caso ocorrido no ano de 2014, nos Estados Unidos, em que, após a cobertura midiática do suicídio do ator Robin Williams, houve um aumento de 10% no número de pessoas que tiraram a própria vida durante os cinco meses posteriores, segundo o estudo da revista científica British Medical Journal.
O mesmo efeito foi observado após a morte de Marilyn Monroe, em 1962, e como consequência da abordagem adotada pela série “Os 13 porquês” (2017) que, como o próprio título indica, apresentou razões justificando o suicídio da protagonista, além de mostrar os meios usados por ela, incluindo autoflagelação. Nos três primeiros meses após o lançamento da série, o número de vítimas nos Estados Unidos aumentou, conforme a pesquisa publicada na revista Jama Psychiatry, e chegou a fazer com que instituições estatais estadunidenses tentassem proibir a divulgação de mortes por suicídio por qualquer meio de comunicação social.
Ciente de que a publicidade de casos que retratam indivíduos que tiram a própria vida pode acidentalmente promover uma estratégia negativa de resolução, há mais de 20 anos, a Organização Mundial da Saúde (OMS) desenvolveu o manual “Prevenção do suicídio: um manual para profissionais da mídia”, capaz de embasar ações em prol do Setembro Amarelo de modo seguro. Algumas das recomendações são evitar divulgar o método empregado, fotos, bilhetes e cartas de despedida, além de explicações simplistas sobre as motivações.
Os profissionais que publicizam os casos e a própria campanha de prevenção devem, portanto, adotar uma abordagem ética e sensível, priorizando a conscientização sobre a importância da saúde mental e informando como indivíduos que estejam enfrentando problemas neste âmbito podem buscar ajuda. Assim, ao invés de falar que “há uma epidemia” ou que “as taxas estão aumentando”, a abordagem mais eficaz é apresentar histórias de pessoas que superaram as dificuldades e informar ao público sobre onde conseguir o tratamento adequado.
A importância do tratamento encontra base no levantamento feito pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), segundo a qual praticamente 100% de todos os casos de suicídio estão relacionados às doenças mentais, principalmente aquelas não diagnosticadas ou tratadas incorretamente, já que os indivíduos que recorrem à violência autoinflingida têm dificuldade nos processos de procurar e encontrar ajuda. Dessa forma, a maioria dos casos poderia ter sido evitada se esses pacientes tivessem acesso ao tratamento psiquiátrico e informações de qualidade.
Problema crítico de saúde pública em escala global, o suicídio é um fenômeno complexo e multifatorial. Assim, a exposição midiática a casos dessa natureza deve ser tratada com o máximo cuidado, especialmente considerando o potencial alcance e impacto das campanhas de marketing dentro das mídias sociais. É por isso que, a cada ano, no Setembro Amarelo, temos que usar o marketing para falar menos de morte e mais de vida.
* Jéssica Souza é Gerente de Marketing da AmorSaúde
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