O marketing nunca foi tão estratégico — e nunca foi tão feminino.
Hoje, mulheres lideram times de marketing em empresas de todos os tamanhos, assinam campanhas que definem posicionamentos e personificam a transformação cultural das marcas. São elas que traduzem as expectativas da sociedade para dentro das companhias e devolvem ao mercado mensagens calibradas com propósito, timing e contexto.
Mas ainda existe um paradoxo incômodo: as mulheres que lideram o marketing, raramente lideram a estratégia. Elas estão nos decks. Nas reuniões de alinhamento. Nas entregas. Mas nem sempre estão nos conselhos. E, muitas vezes, não têm voz na decisão final.

É a liderança sem poder formal. O protagonismo invisível.
O cenário: presença forte no marketing, ausência no topo
Em números, a contradição é gritante. Segundo dados recentes do IBGC e da PwC (2024):
Mulheres representam mais de 60% das posições de coordenação em marketing no Brasil.
Mas ocupam apenas cerca de 20% dos cargos de CMO nas maiores empresas — e um número ainda menor quando falamos de setores tradicionalmente masculinos, como tecnologia, financeiro ou infraestrutura.
Nos conselhos de administração, onde as decisões de alocação de capital, reputação e propósito são tomadas, menos de 17% das cadeiras são femininas.
Ou seja: mulheres lideram as áreas que constroem a percepção da empresa — mas ainda não constroem, junto, o futuro da empresa.
O marketing virou core — e isso muda o jogo para elas
A transformação digital, a pressão por autenticidade e a ascensão das pautas ESG trouxeram o marketing para o centro da estratégia. A percepção virou um ativo. O discurso virou produto. O posicionamento de marca virou fator de valuation.
Nesse novo jogo, o marketing deixou de ser periférico — e passou a ser estrutural.
E isso abre uma oportunidade inédita para as lideranças femininas: usar o poder que já exercem para ocupar o espaço formal que ainda lhes falta.
Porque quem constrói a narrativa da marca, entende o cliente em tempo real e articula linguagem com impacto já está, de fato, liderando. Só falta reconhecimento — e estrutura.

O desafio: romper a barreira simbólica do poder
A liderança feminina no marketing sempre foi aceita — mas raramente celebrada como estratégica.
Em muitos conselhos, o marketing ainda é visto como área de “soft power”, enquanto o “hard power” continua concentrado nas mãos da diretoria financeira, jurídica ou operacional. O viés é claro: o marketing é lido como emocional. E, por consequência, a liderança feminina ali é muitas vezes desvalorizada como técnica.
Além disso, as mulheres ainda enfrentam a necessidade constante de modulação: ser firme sem ser lida como agressiva. Ser estratégica sem parecer invasiva. Ser inspiradora, mas comedida.
É um jogo político que cobra caro — e que muitos homens nem percebem que existe.
A experiência: o que as CMOs mulheres têm mostrado
As mulheres que chegaram lá — as poucas CMOs com cadeira no conselho, com orçamento estratégico sob sua tutela — compartilham algo em comum: lideram com repertório, não com grito.
Constroem coalizões internas. Aproximam marketing e negócio. Transformam dados em narrativa. E mostram que sensibilidade não é oposto de precisão — é ferramenta de leitura.
Elas também redefiniram o papel do marketing: de fornecedor de campanha para radar cultural da empresa. O marketing virou termômetro de risco reputacional, acelerador de adaptação organizacional e eixo de posicionamento institucional.
E é exatamente por isso que ele deveria ser liderado com voz no orçamento e no futuro da companhia.

Se a narrativa é o novo poder, por que as narradoras ainda estão fora do centro da decisão?
O que está em jogo não é apenas representatividade. É inteligência estratégica. O marketing bem liderado por mulheres já demonstrou sua capacidade de proteger, expandir e reposicionar marcas em momentos críticos. Falta agora que o mercado pare de tratá-lo como apêndice — e passe a tratá-lo como direção.
Porque se o marketing é hoje a linguagem do negócio, talvez esteja na hora de dar a palavra a quem já domina o discurso — mas ainda espera o microfone.
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