O som sempre esteve presente em nosso cotidiano, aguçando nossa memória afetiva ou mesmo nos alertando sobre algo. Sons ancestrais, como pássaros cantando ao amanhecer, estão incutidos no inconsciente coletivo ao redor do mundo e são comprovadamente relaxantes e trazem segurança. Isto porque há séculos atrás, quando ouviam-se esses sons naturais, a simbologia era de que não havia predadores por perto. Os anos passaram e, com a Revolução Industrial, também vieram mais ruídos, provindos de máquinas espalhadas por todos os lados. Já com a Revolução Digital, o grande cuidado é com o excesso de estímulos sonoros no universo tech e, consequentemente, a fadiga mental que se acentua nos grandes centros urbanos.

Quando fundei a Soundthinkers, em 2003, eu já tinha essa obsessão por perceber e decodificar sons. Ao longo dos anos, fui aperfeiçoando essa escuta e criei uma metodologia chamada de Sound Thinking. Buscando o aprimoramento a cada projeto, principalmente trabalhando com grandes marcas de dentro e fora do Brasil,  criamos o termo Inteligência Sonora ao conectar design estratégico e som, ajudando pessoas de diferentes perfis a pensarem no som de forma estratégica e 360, como forma  de conscientização desse sentido tão importante. 

De lá para cá, promovemos e mapeamos muitos estudos relevantes - em 2021, por exemplo, realizamos uma pesquisa inédita no Brasil com 339 pessoas cujo foco era descobrir como o som os afeta. Identificamos que 68% dos entrevistados afirmaram que o vilão da poluição sonora nas grandes cidades eram os ruídos gerados pelo trânsito e suas consequências, como transtornos psicológicos severos, cognitivo e, dependendo do grau de exposição sonora, fisiológico. Um problema que permanece até os tempos atuais, principalmente em países que não aderiram plenamente ao uso de carros elétricos. 

Já os sons UX, ligados ao universo da tecnologia, também fazem parte do arcabouço sonoro de todos nós e vem gradativamente ganhando espaço em dispositivos que utilizamos. Desde ícones sonoros de feedback, passando por vozes de assistentes virtuais, o universo tech gera um emaranhado de bips e vozes artificiais. Em outro estudo que realizamos, unimos brasileiros e argentinos para repensar os sons de seus carros. Pudemos identificar que muitas manifestações sonoras que aconteciam durante a experiência de dirigir não eram claras e, por vezes, soavam ásperas e até confusas, criando uma experiência negativa tanto para o usuário quanto para a percepção de marca e produto. 

Acredito também que ter experiência no varejo também contribuiu muito sobre o método de desenhar sons ou o silêncio de forma estratégica. Estudos revelam que, quando a música ambiente está alinhada com a identidade da marca, as vendas aumentam em média 37% se comparado ao uso de músicas aleatórias, evidenciando o poder da consistência sonora na construção de marca. A inteligência sonora vai além: pesquisas indicam que os clientes tendem a permanecer cerca de 42% mais tempo em uma loja quando há música tocando, independentemente do estilo. O volume e a velocidade também influenciam diretamente o comportamento dos consumidores: músicas mais lentas fazem com que andem mais devagar e, consequentemente, aumentem seu volume de compras, enquanto músicas rápidas aceleram o fluxo dos clientes. 

A eficácia da inteligência sonora também é respaldada por estudos científicos: pesquisas publicadas no Journal of Consumer Psychology demonstram que consumidores expostos à música em ambientes de varejo tendem a gastar 38% mais, e que a incorporação de música em anúncios pode aumentar o reconhecimento da marca em 69%. 

E é justamente na mineração de dados sonoros e na construção de marcas icônicas ao longo dos tempos que a inteligência sonora se torna tão fundamental. A inteligência sonora se tornou fundamental na construção de marcas icônicas ao longo dos tempos. O som está presente no cotidiano de milhares de pessoas, em diferentes contextos culturais e/ou comportamentais.  Em uma teia complexa, líderes de marcas, ao redesenhar seus produtos e serviços, precisam adotar uma visão mais profunda e holística para entender esses diferentes padrões e evitarem estereótipos. A inteligência sonora emerge como um diferencial competitivo fundamental, capaz de criar conexões emocionais duradouras e impactar positivamente os resultados do negócio através de uma gestão estratégica do som em todos os pontos de contato com o consumidor.