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Marketing no divã: a luta contra ser somente o P da promoção

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Tempo de Leitura 7 min

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10 de set. de 2021

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Artigos

A afirmação no título possivelmente conduziu você até aqui por refletir uma realidade que tem se tornado cada vez mais latente dentro das organizações. Como profissional de marketing e inovação que sou, já me vi mais de uma vez imerso em falas como "aqui está toda a estratégia de negócios para você criar a campanha de publicidade e plano de comunicação". Ou seja, algo como "pode brincar de campanha de publicidade que a discussão de negócios fica com os adultos aqui". Essa pode até parecer uma situação isolada, mas quando direcionei minha carreira para empreender em inovação passei a encontrar outros profissionais com a mesma dor - o que me inspirou a colocar o marketing no divã em uma extensa reflexão sobre o mercado.

Junto com o meu sócio, conduzimos quinze entrevistas com líderes de marketing de grandes marcas, presentes no dia a dia dos consumidores, e também nos debruçamos para analisar e cruzar dados de mais de vinte estudos das principais consultorias especializadas no segmento. E, inicialmente, chegamos ao seguinte dado: 90% dos entrevistados afirmam que é necessário a renovação do papel do CMO - principalmente nos próximos 3 anos.

Historicamente, a falta de capacidade analítica para mensuração e atribuição de resultados aos esforços de marketing, fez com que a área em si perdesse influência e poder de decisão para outros segmentos gerenciais. O digital tem mudado isso, trazendo análises avançadas de atribuição de resultados e ROI. No entanto, alguma semelhança com o avanço das startups e a era da proficiência em dados não é mera coincidência! Essa exigência e o novo olhar para as necessidades mercadológicas evidenciou o perfil essencialmente executor de grande parte dos profissionais do segmento, que até vende produtos, mas não os desenvolve e nem desenha a estratégia de negócios. E, como consequência, essa postura afastou o marketing dos "4Ps" de Philip Kotler e o aproximou apenas do P de promoção, visto que suas decisões se fundamentam principalmente em intuição e na experiência pessoal para a tomada de decisão.

Essa situação, correlacionada também com a corrida contra o tempo da inovação (fica aqui o tema para um próximo artigo), nos transporta lá para o nascimento do marketing, em que poucos gênios da publicidade se sobressaiam com sacadas criativas sem preocupar-se com o real desempenho do que estava criando - seja em vendas ou em branding - uma vez que o consumidor é imposto em uma jornada com quase nada de competição de mercado.

Nos dias de hoje, podemos chamar esse movimento de marketing midiático ou de vitrine. Inúmeros são os exemplos que tornam essa teoria em uma prática visível no nosso cotidiano. Vejamos um case global: há pouco tempo viralizou na Internet a imagem de um sapato característico da marca Crocs adornado com salto alto, em uma collab com a grife de luxo Balenciaga. O principal atributo de produto valorizado por quem usa Crocs é o conforto, por que alguém valorizaria este produto com salto, se não o ou a própria CMO que adorou ver sua matéria no jornal?

Pois bem, quanto disso se enquadra dentre as principais responsabilidades de um CMO na atualidade, em que o orçamento de marketing como percentual do orçamento total da empresa, atingiu maior proporção nos últimos 8 anos?

De forma local, algo que também gerou burburinho foi uma ação do Burger King que anunciou um sanduíche grátis para quem aparecesse em uma unidade específica na cidade de São Paulo, em uma pequena janela de tempo, com as batatas fritas da concorrência. Pense comigo: o que foi preciso para viabilizar essa ação? Eu posso garantir que logisticamente foi algo que exigiu treinamento e a aplicação de tempo - um dos recursos mais caros de qualquer organização - de diferentes profissionais. Como, jurídico, operações, agências de publicidade, time de assessoria de imprensa, executivos de marketing, todos focados em uma ação que de tão pontual, não pode ter mudado o ponteiro do negócio. O que isso realmente gera de ganho para a marca? Possivelmente um pouco de mídia orgânica e pouco daquilo que realmente importa - conversão e dados.

Temos muitos executivos(as) de marketing que fazem mais ações para sair em veículos de marketing e publicidade do que para os consumidores. Nada contra, se não fossem nossos veículos editoriais de publicidade o mercado estaria muito mais enfraquecido e desvalorizado. 

No entanto, essas duas histórias nos levam a explicar como é que esse cenário de o marketing ser o "P" de promoção se retroalimenta. Ao estar distante da tomada de decisão, fazer ação de visibilidade se torna a única forma de "gritar" o seu valor para as companhias e para as lideranças. E, nesse mar de ações populares e com fator "PRable" para replicação em massa, cada vez mais se afasta do que realmente importa criando outras coisas que não importam - só que agora em uma era em que a jornada do consumidor é algo de extrema valia. Esse ciclo prejudica ainda mais as conversas para aprovação de projetos de marketing com CFOs, uma vez que se cada vez mais o budget da companhia pode cair em armadilhas que não geram valor, o budget para inovar é ainda mais desacreditado e o marketing acaba perdendo voz. Fala a verdade: continua sendo difícil para equipes de marketing serem convincentes na frente de finanças para aprovar orçamento.

Muitos profissionais de marketing nunca abriram um balancete (P&L), ou porque não se interessam ou porque não podem e esta tarefa fica com outra área. E o ciclo continua.

Uma pesquisa da Mckinsey chamada "Find Your Essential" de 2021, feita em 50 países sobre as perspectivas de 3.000 CEOs para o mundo pós pandemia, atesta que somente 19% deles acredita que serão os CMOs que irão desempenhar papel crucial dentro da companhia. Os CFOs são os líderes com 57%, seguidos por COOs com 56% e CIO 39%.

A verdade é: a fila andou! Para nocautear esse papel mínimo a qual o marketing foi diminuído é preciso entender quais os novos desafios, barreiras e responsabilidades necessárias para assumir o desafio. Para se reconectar com a sua essência e estar integrado à empresa e aos negócios é necessário tornar-se o maestro do consumidor internamente, agregando e colaborando com diferentes áreas para criar experiências excepcionais. É tempo de colaborar! De se colocar com influência direta na criação de novos produtos e serviços; de gerar demanda por meio de experiências multicanais; de tomar decisão compartilhada, em cima de dados. E, com isso, tornar-se guardião da marca e das suas experiências 360º; demonstrar sucesso ao gerar crescimento e novas fontes de receita; e, então, reconquistar seu papel determinante na elaboração de estratégias globais.

Não existe mais o protagonismo glamuroso e individual que o marketing detinha no passado. Toda área agora constrói ou corrói a marca. Se quiser existir com voz de negócio, o marketing precisa aprender a ser interdependente.

Na essência a equação é menor glamour com mais exigência em resultados concretos para os acionistas e mais conhecimento para gerar o "cross" entre áreas. Teremos aí a cobertura de um marketing ponta a ponta que encurta as distâncias que afastaram o departamento de Marketing de participar de forma mais integrada e colaborativa nas principais tomadas de decisão da empresa por meio da arte do engajamento (o que sabemos fazer e o que precisamos para ser fundamental para o negócio), da ciência dos dados (como falar a mesma língua de quem alimenta nossos insights de BI, Data Analytics, UX, SAC) e da magia da cultura (como se preparar para colaborar e inovar na busca por novos consumidores, produtos e fontes de receita).

Mas esse recarregar, essa reconexão do marketing com o negócio passa por conseguirmos conectar com outras áreas especialmente no que somos muito bons: conhecimento sobre consumidores, conexão através de histórias e comunicação e pensamento inovador. Temos tudo para fazer isso acontecer, que o marketing recupere sua voz dentro do negócio.

Não é fácil. E, na verdade, é bastante incômodo. Mas, e aí. Você está pronto para o Marketing Reload'

*Eduardo Paraske é cofundador da 1601, consultoria de inovação. Possui mais de 16 anos de experiência em empresas multinacionais, com forte background em marketing, gerenciou marcas, projetos de inovação e criou estratégias para diferentes produtos e categorias para empresas.

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