Bem-vindos a um artigo crítico. E todo artigo crítico só pode nascer de uma provocação, de um incômodo, de uma mente questionadora, então: questione. Hoje vim questionar os encantadores de serpentes, os que “inovam” sem inovar, os que proclamam sem proclamar, os que vendem sonhos, mas entregam pão murcho.
Antes de iniciar minha crítica, caro leitor, eu o quero convidar a uma reflexão acadêmica. Você sabe, de fato, o que é uma inovação? Inovação é o processo de introdução de novas ideias, métodos, conceitos, produtos, serviços ou processos que resultem em melhorias substanciais ou transformações em uma área específica ou mercado. E ela pode ser de vários tipos: sustentável (ou incremental), disruptiva etc.
Cabe aqui salientar que diversas inovações que são ditas disruptivas são nada mais do que incrementais, mas que ganham esse nome devido ao glamour que a palavra ganhou nos últimos anos. Todos querem pisar em Marte, todos precisam do nível de atenção dispensado quando uma grande descoberta é feita: afinal, é da atenção – essa moeda dos dias de hoje – que se faz dinheiro, que se faz capital.
Longe de mim querer que os inovadores de plantão parem suas máquinas: jamais, é da provocação, da crítica, da reflexão e do teste e do erro (incrementalidade) que se fazem boas descobertas. Minha crítica vai para aqueles que bradam que encontraram o novo, mas que, no fundo, estão é mesmo tentando reinventar a roda.
Clayton Christensen, um dos nomes mais respeitados do campo da inovação, foi categórico ao explorar a síndrome que alguns indivíduos e empresas possuem de acreditar que estão inovando assustadoramente, quando na verdade estão simplesmente executando o processo de melhoria contínua. Kotler chama isso de “rebranding”, que é uma tentativa – muitas vezes superficial – de revitalizar a marca (ou conceitos) sem a mudança significativa do serviço. Jim Collins, Everett Rogers, Eric Ries vão na mesma linha e a lista é longa....
Agora voltemos ao título. Gestão de tráfego, o “baita case” dos gurus digitais. A nova salvação da performance dos negócios, a grande descoberta dentro do contexto da publicidade e da propaganda, a nova coqueluche (inclusive, essa que está voltando pela postura anticiência de alguns). Inova? Traz a inovação radical tão necessária que o mercado publicitário necessita? Resolve as dores principais dos pequenos e médios negócios do país?
A resposta é não. A reinvenção do nome e a criação de uma cultura praticamente de seita em torno dos gurus digitais não inova – ao menos não no que é realmente necessário – no processo, no conhecimento de marketing dos profissionais e dos pequenos negócios. Inova sim no discurso: na promessa efetivamente milagrosa, no dinheiro e na prosperidade que um curso de 10 horas pode trazer: como se trocar o nome do problema adiantasse alguma coisa, como se ensinar mídia superficialmente fosse resolver as dores do negócio dos clientes.
São milhões em vendas de curso? Sem dúvida nenhuma. Porém foi Aristóteles que definiu bem que a quantidade não está diretamente relacionada às “qualidades essenciais das coisas”. E é na quantidade que estão interessados. São milhões de promessas embaladas em um discurso posicionado para atender ao interesse de quem ensina e não ao interesse da teoria e do campo do conhecimento em si – quanto mais da performance do negócio de quem contrata esse serviço.
Generalizo? De forma alguma, há dezenas de profissionais que conheço e que vieram dessas escolas e que, de fato, fazem um bom trabalho. Mas minha crítica se concentra na pretensa inovação que tanto se propagandeia. Se queremos construir um mercado mais sólido, com remunerações mais justas e com métodos e processos reconhecidos pelos nossos clientes precisamos, antes de tudo, de rigor.
De consenso entre as partes e de eficácia na entrega dos serviços. Em outras palavras, dar nome aos bois, deixar claro o que está se vendendo e o que está se comprando. Mostrar o lado difícil da história, se apaixonar pelo método, amar o processo.
Outro ponto crucial nesta discussão é que essa pretensa inovação não vem sozinha. Ela vem ainda carregada de críticas às estruturas educacionais formais. Não raro já me deparei com vídeos de gurus dizendo que “ensino superior” é coisa de gente fracassada, que não consegue provar o seu conhecimento sem um diploma. Bem... só esse tópico já seria tema para mais de 20 artigos como este.
E o objetivo aqui é outro: é alertar você – profissional ou cliente – do que está comprando, de como está comprando. Cuidado para não cair na lábia de quem acha que está inovando e sendo o novo Kotler da atualidade quando, na verdade, só está pegando a roda e embalando com celofane.
*Gustavo Franco é administrador, pós-graduado em comunicação digital e mestre em Administração pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Professor da mesma universidade, ESPM e Live University, das disciplinas de dados, marketing, inteligência de negócios e estratégia. É atualmente Country Manager da Labelium, agência e consultoria digital focada no mercado de beleza, moda e luxo. Acumula passagens por BETC/Havas, Santa Clara, Oliver e TikTok. Pesquisador das áreas de comportamento do consumidor e novas tecnologias.
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